quinta-feira, 26 de junho de 2008

Matem o bicho! Cortem a garganta! Tirem o sangue!”


Cibele dos Santos de Oliveira

Acadêmica do curso de Administração da UEM



O livro O Senhor das Moscas de Willian Golding, refere-se a mais do que uma história de crianças e adolescentes britânicos que caem de avião numa ilha deserta. Trata-se de uma análise do comportamento humano na sociedade e sua organização. Em sua obra, Golding traça simbologias no decorrer da história, tornando o livro interessante e estimulante ao leitor. Fato este que lhe rendeu o Prêmio Nobel da Literatura em 1983.

No início da obra, Golding narra que os jovens sobrevivem à queda e resolvem se organizarem entre si, elegendo Ralph como líder, pelo motivo de ter unido todos usando a concha, mostrando dessa forma, um espírito de liderança. Nota-se que os jovens organizam-se como os adultos, buscando uma forma de governo parecida com a Democracia, onde um líder é eleito pela escolha da maioria. De fato, Ralph foi escolhido por todos, com exceção dos meninos do coral por terem medo e serem submissos a Jack. A base da democracia, segundo os gregos, é a igualdade de todos os cidadãos. Igualdade perante a lei (isonomia), e igualdade de poder de pronunciar na assembléia (isagoria), quer dizer, direito à palavra. No livro O Senhor das Moscas, a concha representava este direito de falar, pois todos tinham voz à medida que tomavam a concha para se pronunciarem e exporem suas opiniões.

Eleito líder, Ralph propõe o objetivo de manter a fogueira acesa para produzir fumaça de sinalização, no intuito de serem resgatados por algum navio. No entanto, suas decisões unilaterais fizeram com que o grupo, agisse por sua própria natureza. Ao designar tarefas, Ralph não as fez por imposição, por meio da força, para garantir a ordem e o cumprimento das obrigações. Ele soube unir o grupo e designar tarefas, mas não fez com que as crianças cumprissem seus deveres levando-as a buscarem a satisfação dos seus desejos de comer carne e de caçar. Esses desejos nada mais são do que o próprio instinto humano. Por se tratar de uma tendência natural, o instinto é um impulso espontâneo contrário à razão, fato este que justifica a decisão das crianças ao optarem por mudar de grupo.


Ao satisfazer seus desejos e prazeres, Jack foi a mola propulsora para o desequilíbrio do grupo de Ralph. Ao buscar seus interesses próprios através da caça, acaba formando o grupo dos caçadores com seus argumentos, fazendo de seus interesses, a vontade de todos. Sua atitude de oposição às obrigações propostas, levou as pessoas a mudarem de grupo, deixando o grupo de Ralph na ruína, restando apenas Porquinho e mais dois garotos.


Já Jack garantiu a criação do grupo dos caçadores por duas vias: pela persuasão e pela dominação. A primeira, ele transformou seus interesses particulares em interesses alheios, pois a necessidade de caçar era dele, mas o prazer de comer a carne seria de todos. Para Jack, era melhor caçarem, se divertirem e comerem do que terem as obrigações chatas designadas por Ralph que não surtiam o objetivo esperado (o aparecimento de um navio para resgate), sendo esta a sua posição e argumentação colocada ao grupo. A segunda via foi através de seu típico selvagem. Podemos caracterizar Jack como virtuoso, bem como exposto na obra O Príncipe, de Maquiavel, em que “a virtude do príncipe, estaria na força e na astúcia com que governa e não na justiça em relação aos governados”, seja pela corrupção ou favor, pelo crime ou coerção militar ou por ser amado pelos súditos. A agressividade de Jack fez com que todas as crianças o temessem e obedecessem a suas ordens, pois o medo na política é uma forma de garantir a ordem interna e externa de um país, por meio da coerção militar. Observa-se também que a coerção além de levar à obediência, também fez com que todos do grupo sentissem seguros em relação ao medo que atormentava em forma de monstro. Jack, no entanto, consegue garantir a ordem pela força, mas seu poder não se justifica, pelo fato de buscar interesses particulares e não interesses comuns.


Quando Jack rouba os óculos de Porquinho para produzir fogo com as lentes, nota-se que ele não se sentia submisso a Ralph, por isso preferiu roubar os óculos a pedir emprestado, por uma questão de orgulho e sentimento de poder. E como se não bastasse roubar, o grupo dos caçadores mostra sua dominação de característica tirânica, ao pintarem seus corpos, tornando-se imunes às punições ou repressões e revelando-se o braço armado do grupo - agentes da dominação – também ao planejarem matar o líder do grupo rival e ao quebrar a concha, sinal da democracia para o outro grupo. O interesse do grupo dos caçadores era o fim do poder democrático e a predominância do poder despótico, que se conduz pelo arbítrio dos detentores eventuais do poder, oscilando ao sabor dos interesses e caprichos pessoais.


Esta obra de Willian Golding expressa sua descrença na capacidade dos homens em criar um mundo melhor. Mesmo começando tudo de novo, a sociedade se corromperia, pois a maldade faz parte da natureza do homem. No entanto, o problema não está na maldade humana e sim em como nos organizamos politicamente. É preciso um governo que garanta o “fim mínimo” da política, exposto por Norberto Bobbio, em seu livro O Significado de Política, que é a ordem pública em suas relações internas e a defesa da integridade nacional nas relações de um estado com outros estados. Este fim é mínimo, por se tratar de um ponto de partida para alcançar os outros fins específicos de cada sociedade. É preciso um governo que garanta a integridade da nação, buscando a ordem e o bem comum e não apenas interesses e privilégios para poucos.



REFERÊNCIAS:


Golding, Willian. O Senhor das Moscas.


Bobbio, Norberto. O que é política.


Bobbio, Norberto. O Significado de política.


http://www.loveira.adv.br/material/tge17.htm - Data da visita: 02/06/2005.


http://www.renascebrasil.com.br/f_democracia.htm - Data da visita: 02/06/2005.


http://educaterra.terra.com.br/voltaire/politica/democracia.htm - Data da visita: 02/06/2005.




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